sábado, 31 de janeiro de 2009

O cachorro da família

Quem nunca teve ou tem um cachorro para alegrar a vida? Um animal como esse também serve para as pessoas ganharem mais responsabilidade, afinal alguém depende dos seus cuidados sem nunca reclamar. Na verdade, vira um verdadeiro filho ou filha porque ganha carinho, presentes e atenção igual ou, em alguns casos, maior em relação ao ser humano. Em Suzano, o cão da vez da família também se tornou uma bela terapia para ajudar na minha recuperação.

Desde que os meus pais moram nessa residência, inclusive a boa parte da minha infância, 12 cães já passaram por aqui. Foram quatro pastores alemães com nomes Julião, Sheik, Halley e Schumacher, três pastores belgas (Nick, Benji e Ninon), três vira-latas (Julin, Pixote e Ringo), um pequinês (Pingo) e até um são bernardo (Tuti). Quanta variedade.

A bola da vez é o Schumacher. Ele convive conosco desde 2002 quando eu e o meu pai fomos buscá-lo na casa de um rapaz que compareceu à delegacia de polícia para saber se a Polícia Militar queria mais um cão nos quadros da corporação. A doação era necessária porque o outro cachorro do antigo dono judiava dele. Assim, a família decidiu adotá-lo.

O nome foi escolhido devido à sua raça. Nada como um alemão para dar nome a um pastor alemão, como mencionou o Jonathan. O animal cresceu, deu alegrias a todos nós nesse tempo e vigia a casa com o seu porte.



Atualmente, o Schumacher me auxilia voluntariamente com a fidelidade canina. Sempre quando saio no quintal, ele se aproxima imediatamente de mim e coloca sua cabeça para acariciá-lo. Ou ainda, se joga nos meus pés para brincar. Nesse período, costumo esquecer totalmente dos meus problemas e das dificuldades dessa fase de recuperação.

Mas também não me esqueço da alimentação, apesar dessa missão ser feita diariamente pelo meu pai por vontade própria. Esporadicamente, levo a comida dele. Para agradá-lo, também levo alguns ossinhos ou pão durante o dia. O fiel cão fica numa felicidade. Essa situação me obriga a fazer um esforço para andar, o que ajuda na reabilitação.

Além dessa colaboração, um cachorro também tem outras missões se ganhar atenção. Uma delas é transformar seu dono na pessoa mais importante do mundo com a lealdade. O animal não te abandona tanto nas horas alegres quanto em tempos difíceis, diferentemente do ser humano, que só leva em consideração os bons momentos que aconteceram antes do acidente. Fora isso, é o único amor que a gente consegue comprar sem exigir nada em troca.

Santa chuva

Sexta-feira chuvosa. Uma noite bem típica para assistir a um bom filme ou ler um livro. Afinal de contas, esse cenário sugere a não sair de casa, ao contrário de um céu estrelado que incentiva a pessoa a arriscar um programa num barzinho ou na balada até altas horas. No entanto, o mau tempo deste dia veio bem a calhar, não porque estou impossibilitado de me deslocar sozinho. Por causa da chuva, o ensaio da Escola de Samba Cara Preta, foi suspenso para minha alegria. Obrigado São Pedro!

Por causa da ação divina desse conhecido santo, eu consegui uma trégua aos meus ouvidos e uma noite mais tranquila, sem os ruídos dos tamborins e do puxador de samba. Com a proximidade do Carnaval, acompanho involuntariamente os ensaios da agremiação, que participa dos desfiles organizados na cidade de Suzano. A quadra da escola fica bem ao lado da casa dos meus pais. Enfim, o sossego.

Por outro lado, a santa chuva também traz um barulho do lado de fora da residência. É aquele gerado pela água caindo. Porém, isso soa como se fosse uma boa música nos meus ouvidos, bem diferente dos treinos dos carnavalescos do bairro. Eles que me perdoem, mas os ensaios incomodam, principalmente para quem não curte muito desfiles carnavalescos.

Infelizmente, a tranquilidade foi momentânea até o final de fevereiro. Até o Carnaval, a agremiação voltará a ensaiar todos os passos da bateria. O jeito é me preparar psicologicamente para acompanhar os dias de folia, já que as apresentações em Suzano ocorrerão no bairro onde estou durante essa fase de recuperação. Mas aguardo ansiosamente uma nova manifestação de São Pedro, entre as 20h30 e 23h30.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Verdadeiro e superficial

O período de descanso forçado em razão do acidente serviu para tirar conclusões ou refletir em relação a muitas situações do cotidiano. Parece um verdadeiro clichê, mas também um momento difícil da vida sempre nos traz boas lições. É a pura verdade e me provou isso. Até fiquei mais atento aos diversos recados trazidos pela fatalidade. Uma delas é medir quem realmente gosta de mim. Realmente, apenas as pessoas que têm grande consideração entram em contato nessas horas.

Faremos um comparativo. Quando estamos em meio à diversão, todos são amigos do peito e dão tapas nas costas para cumprimentar. Fora algumas mulheres (nem todas são assim), que bajulam um bonitão ou o rei do pedaço. Evidente, precisamos aproveitar as oportunidades ou virar o jogo favoravelmente para fazer a tradicional média ou a política da boa vizinhança. Tudo isso com objetivo de ter um bom relacionamento.

Como tudo isso é superficial porque fica muito fácil dizer que é amigo de uma pessoa nessas horas ou ser presente apenas na alegria. Um exemplo disso é um grande companheiro de muitos anos. Só não citarei nomes para preservar os personagens mencionados. Apesar de ser considerado popular no ambiente de trabalho, poucos colegas foram dar apoio após sua demissão. Eu fui prestar solidariedade. E onde estão aqueles que o abraçavam nas festas de confraternização ou nas baladas?

Tenho mais uma história. Um outro amigo me confidenciou que nenhuma pessoa do canal de relacionamento dele se manifestou quando estava muito doente. Não recebia telefonemas, mensagens de e-mail ou visitas em casa. Muito triste, não é mesmo? Ele só me contou anos mais tarde do ocorrido. Por isso, nem soube dessa fase de dificuldade. Assim, fiquei com peso na consciência. Onde eu estava quando um grande cara mais precisava?

Eu o questionei por que ele não havia me dado um toque. A resposta dele foi bastante sábia. Disse que amizade se cultiva e não se reivindica. Concordei imediatamente, mas me senti culpado. Felizmente, consegui corrigir a minha pequena ausência.

Por esses e outros casos, eu cheguei a uma conclusão. Na verdade, reforçou a minha tese de valorizar apenas as amizades verdadeiras. E essa fase de recuperação me ensinou a agir desta forma com muito mais ênfase. Só darei importância para os companheiros que se importaram comigo. Por outro lado, deixarei os ausentes seguirem seu caminho normalmente porque um dia precisarão de ajuda ou de um apoio.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Uma partida de futebol

A volta do convívio com a família devido aos dias de recuperação também trouxe momentos há muito tempo não vividos por mim durante os últimos anos. Afinal, a falta de tempo sempre me obrigava a estabelecer prioridades a outras coisas (muitas delas não mereciam dedicação). Vinha cada vez menos visitar os familiares. Mas essa situação se reverteu, pois não consigo sair de casa quando bem quero. O jeito foi assistir futebol. Hora de ver uma partida do Corinthians.

No entanto, nenhuma emissora de TV aberta iria transmitir o jogo. Inicialmente, acessei a programação de uma rádio pela internet para acompanhar todos os passos do Timão, que jogava contra o Botafogo de Ribeirão Preto. Veio o primeiro gol de pênalti logo no início. Mas logo o meu pai veio no quarto e perguntou se não iria ver a partida.

Respondi que não tinha como, mas meu pai disse que o Jonathan tinha acesso a uma transmissão em vídeo pela rede mundial de computadores. Desta forma, pedi para chamá-lo. Soube que ele era sócio do site da TV Timão. Entramos nele e começamos a assistir ao jogo.

Antes disso, o Jonathan estava no carro dele ouvindo a partida pelo rádio. Com essa iniciativa, o quarto onde fico voltou a ser cenário de uma cena que há não acontecia há muito tempo. Os três corinthianos juntos estavam novamente reunidos para acompanhar futebol: eu, o pai e o irmão. Desta vez, a nossa televisão era um monitor de computador de apenas 17 polegadas.

A reunião familiar teve direito a refrigerantes (para mim, suco por conta da recuperação), salgadinhos e até pipoca. A minha mãe ficou sozinha na sala. Só não veio assistir porque não aguentou o cansaço e dormiu no sofá. Vibramos das tentativas de gol, reclamamos dos passes errados. Foi até engraçado. Pena que esqueci de fazer uma foto.

Ao final da partida, ficamos satisfeitos porque o Coringão ganhou por 2 a 0. Depois, cada um voltou à sua rotina. Meu pai foi tomar banho para dormir. O Jonathan foi embora em direção à casa da namorada dele. E eu voltei a navegar pela internet atrás de notícias e atualizar esse blog. São as poucas coisas que consigo fazer sem ajuda dos parentes em meio à recuperação.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Saudades da natação

A fase de recuperação é longa. Haja paciência. Por esse motivo, estou afastado do trabalho e das minhas outras atividades diárias. A mais prazeroza delas era nadar. Gosto tanto de praticar esse esporte, que fazia sacrifícios para não deixar de ir aos treinos quando morava em São Bernardo do Campo. Acordava todos os dias às 5h30, tomava um rápido café da manhã e embarcava num ônibus de linha em direção à academia. Nessa época, o meu carro - aquele totalmente destruído no acidente - se encontrava no funileiro.

Mesmo assim, eu não desanimava. Chegava para o treino diário às seis horas. Antes de cair na piscina, passava na sala dos aparelhos e fazia as sessões de musculação. Em seguida, ia para o treino de natação. Ficava em média uma hora e meia nesse treinamento. (Termino esse texto daqui a pouco. Agora é hora do jogo do Coringão)

(Feliz com a vitória do meu Timão por 2 a 0 contra o Botafogo de Ribeirão Preto, retomei essa jornada agora, 0h57)

Atingia a marca de quatro mil metros bem nadados. Quanto fôlego. Deixava a academia pontualmente às 9h30 em direção ao jornal, em São Paulo. A viagem era de ônibus e depois de metrô.

Quanta saudade de retomar os esportes. Ela aumentou ainda mais hoje, depois de ter recebido um telefonema da Dani, a coordenadora da academia onde treinava até o desastre. O motivo da ligação era saber o meu atual estado de saúde e se tinha previsão de retorno. Contei detalhadamente todos os passos dessa reabilitação.

Mas a grande notícia veio logo em seguida. O contato feito pela Dani também tinha outra finalidade. Após a rápida conversa, ela me informou que havia conquistado o segundo lugar de um torneio interno de natação organizado pela academia dias antes do acidente, em outubro passado.

A competição consistia num revezamento de 12 horas, em que os participantes entravam numa das três equipes formadas. O nadador escolhia ou nadar durante 30 minutos ou por uma hora. Eu escolhi a segunda opção. Desta forma, o competidor com a segunda melhor marca individual nessa categoria. Nesse tempo, completei 3,55 quilômetros (ou 3.550 metros). O campeão fez 4,2 quilômetros (4.2oo metros).

O prêmio não é algo excepcional. No entanto, sempre é bom ganhar um troféu pelo bom desempenho. Pode parecer um tanto egocêntrico, porém a felicidade foi grande porque trata-se de bom um resultado pela tamanha dedicação em algo que tenho o imenso prazer de me dedicar. Além disso, a notícia caiu do céu num momento difícil. Serviu para me incentivar a ter uma disciplina ainda maior na minha recuperação e, desta forma, poder voltar a nadar e praticar musculação. E quem sabe rumo às maratonas de águas abertas ou mesmo competições de triatlon.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

O tempo

Acompanhava o noticiário da noite na sala de casa. Entre uma reportagem e outra, escutei a buzina de um carro. Imediatamente, olhei para a janela e percebi que a visita era aqui mesmo. De imediato, eu não consegui identificar as pessoas. Mas poucos segundos foram suficientes para reconhecê-las. Não se tratavam simplesmente de ocupantes do veículo estacionado na rua. Na verdade, eram as grandes amigas de longa data. Fazia muito tempo.

Após anos de distância, o acidente sofrido em novembro foi suficiente para reunir parte daquele grupo de companheiros e companheiras que viveu bons tempos de juventude, como baladas, festas de aniversário e grandes rodas de conversas. Na minha sala, estavam novamente a Tatiana e a Milena. Há quanto tempo!

A visita tinha a finalidade principal de saber sobre o meu estado de saúde e como andava a recuperação depois da internação. Mais que isso. Essa reunião mais recente me levou a uma viagem. Em minha mente, recordei de algumas dessas aventuras. Muitas delas ocorreram a bordo do Fusca branco, ano 1983. Isso há 12 anos, direto do túnel do tempo.

Dentro dele, nós três mais a amiga Kimie (hoje, ela vive no Japão) e o Jonathan (o irmão mais novo) partiámos em direção às baladas da cidade vizinha, Mogi das Cruzes. Nesse período, o grupo visitou o antigo Padang Padang, a balada de Natal do Clube Náutico Mogiano e a Black Knight. Nesse período, eu dava os primeiros passos no jornalismo, o Jonathan estudava o ensino médio e a Kimie já revelava as pretensões de morar na terra do Sol Nascente. A Tatiana e a Milena se preparavam para entrar na faculdade. Isso é o tempo.

No entanto, a minha memória viajou ainda mais longe. Voltei para 1995, quando as conheci por intermédio de um outro colega. Ao vê-las, nunca imaginei que nasceria uma grande amizade com essas "meninas", como costumava e ainda costumo chamá-las carinhosamente. A grande união começou a se concretizar na antiga danceteria NDO, em Suzano. Por outro lado, esse rapaz que as apresentou se distanciou de vez. Em seguida, o Jonathan completou o grupo. Coisas do tempo.

Logo nesse ano, também vieram as festas de aniversário e churrascos. Várias delas reuniram mais de 50 pessoas. O clima era dos melhores, tanto que esses eventos vararam a noite, a madrugada e parte da manhã do dia seguinte, sempre regados a muita comida e bebida. Quantas vezes, eu voltei a pé para casa às 10 horas? Não me preocupava com o tempo.

Também resgatei das minhas lembranças a última festa que nos reunimos. Foi em 2005, quando a Tatiana se mudou para o Rio de Janeiro atrás de novas oportunidades. Os anos se passaram e cada um trilhou o seu próprio caminho. Eu continuo no jornalismo, o Jonathan se tornou policial civil, a Tatiana se formou em fisioterapia e a Milena está prestes a concluir o curso de radiologia. Já a Kimie se casou no outro lado do mundo com outro dekassegui e tem até um filho. É o tempo.

De volta ao presente, percebi algo muito bom nessa passagem dos anos. Apesar do distanciamento em razão das diferentes trajetórias de vida de cada um de nós, a amizade ainda persiste. E o que é mais importante, continua sólida apesar dos meus defeitos. Por esse motivo, fico feliz por ter cultivado grandes amigos e amigas sem deixar de ser a pessoa que sou desde pequeno. São as marcas do tempo.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Adeus playmobil

Acordei no horário habitual. Fui ao banheiro e depois acompanhei o noticiário pela TV. Coisas que sempre faço em meio a essa fase de recuperação após o acidente. Entre esses e outros afazeres, dei aquela olhada habitual no espelho. Novamente, o susto foi inevitável. As madeixas formavam um visual indecente e horripilante. Por esse motivo, tomei a importante decisão de cortar os meus cabelos. Eram os últimos momentos da era Playmobil.

Até então, esse formato pairava na minha cabeça. O motivo era porque o corte das minhas mechas estavam numa forma totalmente quadrada e com a franja tinha algumas pontas na testa. Um verdadeiro capacete peculiar do tradicional boneco, que tinha nos tempos de infância. Afinal, fiquei três meses sem dar um trato no visual.

O tempo passava e a vontade de deixar os cabelos em ordem só aumentava. Esse desejo cresceu quando fui penteá-los antes de ir à clínica de fisioterapia. A convicção de que precisava ajeitar a minha situação chegou de vez quando me via no espelho enquanto fazia os exercícios de reabilitação. Não pense que sou narcisista demais. O olhar para o meu reflexo tinha o objetivo de corrigir os movimentos das atividades passadas pelo fisioterapeuta.

O dia seguia adiante. Fui ao supermercado e depois devolver os DVDs alugados na locadora. Mas minha meta principal de deixar de ser um playmobil ainda era uma incógnita. Ao terminar os compromissos do dia, pedi para o meu pai me levar ao salão da Elisângela. Quem não a conhece, ela tem dois codinomes: a mãe da Rafaela (a sobrinha que chega em fevereiro) e a namorada do Jonathan, o irmão do Eric Fujita.

Assim, fui em direção ao meu primeiro corte de cabelo desde o acidente que sofri. Sentei na cadeira do salão e pedi para não cortar muito curto. A Elisângela sugeriu como faria e imediatamente aceitei. Desta forma, ela colocou a capa para me proteger da sujeira e mandou ver com uma tesoura na mão.

Quanto a mim, o jeito foi acompanhar todos os passos pelo espelho que estava na minha frente. A cada cortada, ia uma mecha dos meus cabelos. Aos poucos, o formato capacete dava lugar a um novo corte mais decente e arrumado. Quando a Elisângela terminou, veio a sensação de dever cumprido. Na verdade, de objetivo atingido, afinal queria fazer isso desde o meu despertar.

Além disso, quis arrematar o meu visual. Pedi para ela raspar a minha barba que havia crescido desde a antevéspera de Natal. Prontamente, a Elisângela atendeu o meu último pedido. Os riscos de canetinha no meu rosto também foram embora. Deixei de ser um tremendo cabeção com todo esse trabalho feito com muita dedicação. Estava mais uma vez de cara limpa e magra. Desta forma, dei adeus à era Playmobil da minha vida.

Apesar de tudo, falta apenas um esclarecimento. Não tenho nada contra esses simpáticos bonequinhos. Pelo contrário, pois eles fizeram parte da minha infância. Mas na vida real, deixar os cabelos chegarem a esse ponto só me trouxe uma conclusão. Relaxei demais na vaidade.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Carnaval involuntário

O Carnaval já está bem próximo do nosso calendário de feriados. Muitas vão se divertir no meio da folia ou nas praias brasileiras e ainda se refugiam da correria do dia-a-dia. Por outro lado, os carnavalescos se preparam para os desfiles com tradicionais ensaios. No entanto, eu já acompanho todos esses passos a menos de um mês dessa manifestação popular, que encanta o mundo. São as agremiações do Grupo Especial de São Paulo, como a Vai Vai, Rosas de Ouro? Ou as do Rio de Janeiro (Beija Flor, Mangueira, Imperatriz Leopoldinense)? Nada disso. Trata-se da Escola de Samba Cara Preta, da cidade de Suzano.

O acompanhamento, evidentemente, é involuntário. Diariamente, escuto os membros da bateria e o puxador de samba. Isso acontece sempre entre as 20h30 e 23h30 na quadra da escola, montada num terreno existente no bairro onde os meus pais moram. Essa área fica bem ao lado de casa. Será um castigo contra alguém que não curte Carnaval?

Se algumas pessoas souberem disso, certamente darão risada ou falarão "bem feito" para mim porque já me recusei muitas vezes de ir aos desfiles das principais agremiações de São Paulo ou as organizadas no interior do estado. Além disso, já havia falado que não gostaria de ir à passarela do samba carioca, considerado o maior Carnaval do mundo.

Será penalidade em dobro? Afinal, presencio, com os ouvidos, os preparativos para os desfiles. E o pior de tudo, uma escola sem importância no cenário brasileiro. Se fosse assim, seria menos pior suportar as agremiações paulistanas ou cariocas.

E o problema só irá piorar. A avenida onde ocorrem as apresentações em Suzano fica exatamente no bairro onde estou durante essa fase de recuperação. Talvez seja obrigado a acompanhar os quatro dias de folia do Carnaval sem ao menos querer. Não podemos ter tudo o que queremos nessa vida....

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Hora de tomar choque

Chegou a hora da fisioterapia para me recuperar. Faço todos os exercícios necessários e recomendados para recuperar o resto dos movimentos da perna esquerda. Na verdade, preciso reconquistar a força dela para abandonar a única muleta e voltar a dar os meus passos normais. Após a exaustiva rotina, o jeito é passar por uma sessão na própria clínica de reabilitação, que alivia as dores musculares. Na verdade, é o momento de tomar bastante choque.

Isso mesmo. A aplicação de analgésicos ocorre a base de correntes elétricas. Além de diminuir a sensação dolorida, o procedimento também estimula as articulações e a musculatura da perna. No início, há um certo desconforto. Mas o corpo acostuma rapidamente com essas ondas de eletricidade.

Bom, vamos às explicações técnicas. O sistema usado é por estimulação elétrica transcutânea. Na fisioterapia, o esquema se chama de TNS. A transmissão dessas correntes elétricas fica por conta de um aparelho também conhecido pela mesma nomenclatura. De acordo com publicações especializadas, essas sessões estão "isentas de contra indicações e efeitos colaterais". Já o equipamento é portátil, de fácil operação, de baixo custo e consumo.

De volta ao campo prático, o choque chega aos pontos doloridos da perna por meio de fios ligados no aparelho de TNS, que terminam com uma camada de borracha colocada na pele. Os fisioterapeutas fazem essa fixação com aquele gel utilizado nos exames de ultra-som.

Para segurar melhor a fixação, eles contam com a ajuda da tradicional fita crepe. Além disso, também utilizam de uma técnica caseira, sempre empregada no alívio da dor: a compressa gelada. E a coisa funciona. Olha só como fica a minha perna nessas sessões:


Assim, eu me empolguei e fiz mais uma foto. Olha só como as duas pernas estão retas e uma do lado da outra. Para mim, isso é um feito porque antes eu mal conseguia esticar a esquerda:

Durante a sessão de choque, acontecem algumas situações inusitadas. A principal delas é o tamanho estímulo ocasionado pelas ondas elétricas, que fazem os meus cinco dedos do pé se mexerem involuntariamente. Os movimentos são como se eles dançassem incansavelmente. Em certas ocasiões, eu até dou risada sozinho na sala. Cheguei a pensar que esses estímulos na cabeça poderiam me ajudar a usar melhor o meu cérebro no tranco. Será?
Antes de usar o gelo, eu também via o meu joelho se movimentar. Tremia tanto que era muito engraçado. Não conseguia contar quantas vezes mexia. Fazia essas coisas como uma forma de passar o tempo durante os 20 minutos dessa sessão. Quando saio dela, as articulações exigidas nos exercícios saem sem dores e preparadas para o dia seguinte. É o preço necessário para se pagar em favor da recuperação. E estou pronto para o sacrifício, desde que consiga andar normalmente.

Culpa do novo celular

O tempo passou muito rápido. Bem que abri a página para fazer a atualização diária. No entanto, eu perdi totalmente a noção do horário e esqueci de escrever algo conforme faço em meio ao meu afastamento por conta da recuperação. Tudo isso foi por culpa de um pequeno aparelho. Trata-se de um novo celular, adquirido com um belo desconto da operadora.

O abatimento no preço só foi possível graças a um programa de fidelidade da empresa (não vou falar o nome dela porque nenhuma destas companhias merece a minha propaganda de graça), mantido junto aos seus clientes. São as estratégias utilizadas para manter o consumidor em meio à acirrada concorrência entre as quatro concessionárias responsáveis pelo serviço no estado. Desta forma, o jeito é aproveitar essas facilidades.

Com o aparelho novo em mãos, o jeito foi manuseá-lo para aprender todas as funções. Quando eu vi o relógio, havia passado mais de três horas. Eu tinha até uma ideia do que contar nesse novo (e talvez temporário) compromisso diário. Fazer o quê se esqueci de fazer isso. O jeito é pedir desculpas para os poucos leitores e guardar a próxima história.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Os anjos da guarda

Os 20 dias de internação no hospital foram os piores momentos da recuperação. Não podia me mexer e muito menos sair da cama porque a minha perna esquerda estava toda imobilizada. A dor na região da fratura era tão forte. Por esse motivo, precisava tomar medicamentos e seguir as determinações do médico. Para cumprir as recomendações, eu precisei da ajuda de outras pessoas, que se tornaram verdadeiros anjos da guarda devido às limitações físicas.

Um grupo de enfermeiros e enfermeiras se revezavam dia e noite para deixar a minha estadia no Hospital Baeta Neves menos sofrida. A unidade médica fica em São Bernardo do Campo. Eles controlavam a pressão arterial, a temperatura, aplicava injeções e levava os medicamentos receitados pelo ortopedista. Além disso, davam banho na própria cama. Eram muito precisos no tratamento.

Dentro desse pessoal, alguns profissionais conseguiram uma afinidade maior comigo. Pela manhã, duas enfermeiras sempre iam me atender. A Cida (com óculos) era uma pessoa de meia idade muito bem humorada. Sua irreverência conseguia trazer risos nas primeiras horas do dia. Já a Neiva (a loira) me tratava com muita delicadeza. Conversava como se eu fosse uma criança. As duas fizeram questão de posar na foto um dia antes de ter alta:

Em seguida, precisei assumir a câmera, afinal minha mãe queria sair bem na imagem. No entanto, nenhum amigo fotógrafo estava por perto:

Mas existem outros profissionais que consegui fazer boas amizades. Infelizmente não consegui fazer o mesmo registro fotográfico. Além delas, tinha uma outra dupla de enfermeiras muito competentes. Só a Dinah e a Elza foram responsáveis por eu ter perdido o medo de tomar banho na cama, sempre à noite.
Elas faziam o serviço com o tamanho cuidado, bem diferente de um outro grupo que me balançou e me fez sentir dores insuportáveis na fratura. Por esse motivo, só queria essa dupla para cuidar de mim nesse quesito.
Não poderia esquecer da Erica e da Cláudia, que iam ao quarto à tarde. A primeira, uma jovem bonita, parecia dar os primeiros passos na profissão. Nem por isso demonstrava inexperiência e se destacava por ser bastante atenciosa. Em muitas ocasiões, ia me acalmar quando me desesperava na hora do banho com medo de sentir dores. E conseguia. Fora isso, ganhava pontos por ser minha xará.
Por outro lado, a Cláudia me confidenciou que tinha 35 anos de experiência no ramo. A calma dela também me deixava mais relaxado no leito do hospital. Por isso, eu me referia sobre essa enfermeira como "boazinha". Tanto ela quanto a Erica tinham em comum a habilidade de aplicar injeções. Com as duas, eu nem sentia a picada.
Eu ainda tento lembrar o nome de uma outra enfermeira muito gente boa. Quanto relapso da minha memória. Essa também era engraçada demais e a chamava de "arretada" por ter um sotaque típico do nordeste. Na verdade, havia nascido no Paraná, mas seus pais eram do Piauí.
A dedicação mostrada por esses profissionais mostra um dom bastante importante para uma pessoa: a paciência. Imagino como eles devem lidar com pacientes de todos os tipos. Existem aqueles mais irritados, como eu, outros mal educados ou aqueles mais chatos. Isso não é para qualquer um.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Mais uma vítima do INSS

Como é difícil depender dos órgãos públicos para conseguir um benefício. Algumas dessas repartições são verdadeiras provas de falta de competência quando o assunto é atender ao público em geral. Um verdadeiro desrespeito às pessoas, que colaboram mensalmente com a finalidade de ter uma ajuda quando a dificuldade aperta, seja por causa de um acidente, doença ou pensão do falecido beneficiário. Sei disso porque também virei mais uma vítima do Instituto Nacional do Seguro Social, mais conhecido como INSS.

Se dependesse desse órgão, talvez já teria morrido de fome. Cheguei a essa conclusão devido à demora de quase dois meses para resolver o meu problema. Em razão do meu acidente, deveria receber mensalmente o auxílio-doença do nobre instituto no lugar do meu salário devido ao afastamento das minhas funções. Mas até agora não consegui um só centavo. Quanto descaso!

O jornal onde eu trabalho até deu aquele apoio para dar entrada no pedido de perícia que o INSS deve fazer em mim para avaliar se eu tenho direito ao benefício. A saga começou quando essa consulta foi agendada para o dia 25 de novembro numa agência na capital. Na ocasião, veio o primeiro entrave. A repartição exigia a minha presença no local.

No entanto, precisei mandar o meu irmão no meu lugar com toda a documentação exigida e uma declaração do médico que estava impossibilitado de ir ao local porque não podia sair da cama. O processo foi transferido para o posto do INSS de Suzano, que determinou a realização dessa perícia em casa. Os meus mais moram nessa cidade onde estou por conta da recuperação.

Para isso, esperei mais 21 dias. O instituto só enviou um médico-perito na minha atual residência somente em 16 de dezembro. Ele me avaliou e disse que ficaria entre três e quatro meses afastado do trabalho por causa do acidente. Além disso, me informou que o INSS enviaria uma correspondência com os dados de como receberia o auxílio-doença. Até agora, essa carta sequer chegou até aqui.

Desta forma, ainda aguardo uma resposta do tão eficiente instituto. Na verdade, o meu pedido ainda permanece parado. Os meses de dezembro e janeiro já se passaram, mas nada de receber o benefício que tanto preciso, afinal a empresa não pagará o salário integral até o meu retorno. Além disso, necessito saber o valor do auxílio para que o local onde trabalho faça a complementação até atingir o total do meu vencimento. Até lá, tudo fica indefinido.

A situação mostra o descaso e a lentidão do INSS junto à população. A sorte é que ainda tenho uma família para ajudar e uma sobra do 13º salário pago no final do ano que me mantém até hoje. E se não tivesse esses fatores favoráveis? Viveria de vento? Coitado dos acidentados ou dos doentes mais humildes que só dependem do benefício durante os momentos difíceis.

domingo, 18 de janeiro de 2009

Igual a um playmobil

Mais um domingo em casa. Acordei tarde porque meus horários estão descontrolados por causa da mudança da rotina devido à recuperação. Eu me levantei em direção ao guardarroupa para olhar o espelho e pentear o cabelo. Quando vi aqueles fios do jeito que estavam, tomei um tremendo susto. A impressão foi um tanto curiosa. Parecia um personagem de brinquedo amado por muitas crianças durante a minha infância. Era igual a um playmobil.


A semelhança ficou evidente porque o corte do meu cabelo ficou totalmente quadrado. E a franja se encontra com algumas pontas na testa. Igual ao formato capacete do tradicional boneco, que também tinha como os demais meninos dos meus tempos de inocência. Isso é o resultado de quase três meses sem dar um trato no visual. Não cuido deste quesito desde o acidente.
No entanto, a minha atual fisionomia se encontra ainda pior. Deixei a minha barba crescer. Assim, ela parece um verdadeiro desenho de canetinha preta no rosto, igual a de alguns modelos de playmobil. Só não vou mostrar a minha foto como estou hoje porque tenho vergonha.
Mas essa comparação me fez lembrar de um período da minha vida onde não existiam preocupações, como trabalhar, pagar contas e cumprir outros tipos de compromissos. Eu tinha um conjunto de playmobil com os bonecos com cabelos de capacetes e um barco motorizado, movido a pilha. Adorava brincar com esse kit na bacia cheia de água que a minha avó enchia na casa dela.
O tempo passou. Só não sei se atualmente as crianças continuam interessadas nesses simpáticos bonequinhos. Com o desenvolvimento da tecnologia, novos brinquedos chegaram. Nesta relação, estão jogos eletrônicos portáteis e os vídeo games. Apenas espero que o público infantil de hoje tenha a mesma felicidade durante a infância como eu tive.

sábado, 17 de janeiro de 2009

Reaprender, a palavra do momento

Reaprender. Essa palavra está muito presente no meu dia-a-dia, principalmente por causa da recuperação após acidente que sofri em novembro. O significado dela se tornou muito importante porque agora atinge situações até então corriqueiras para um ser humano normal. Nunca imaginei que aplicação do seu conteúdo ocorreria em algo tão presente numa pessoa desde criança: a atitude de andar.

Desta forma, precisei e ainda necessito disso. Reaprender a andar. Pode parecer estranho, mas é isso que faço diariamente quando vou à clínica de fisioterapia. Depois do desastre, perdi a força e os movimentos da minha perna esquerda. Ela ficou bem mais fina se comparada com o lado direito somente porque fiquei sem utilizá-la por 20 dias devido à imobilização.

Na rua e em casa, eu conto com a colaboração do par de muletas. No entanto, não posso depender desse artifício para sempre. Então, vou todos os dias treinar as passadas. O aprendizado é bem diferente em relação ao de um bebê, que conta com a ajuda dos pais e de um andador infantil.

Os exercícios são feitos numa espécie de plataforma cercada de apoio para o paciente. Dentro do programa feito pelo fisioterapeuta, eu caminho dez vezes nele (inclui ida e volta). O treino é fazer tentar fazer o passo normal de uma caminhada. Porém, ainda não consigo isso totalmente, pois a musculatura da perna esquerda ainda está muito fraca e não suporta o peso de todo o corpo.

Para vencer esse obstáculo, costumo fazer essa e outras técnicas a mais na clínica como forma de agilizar a recuperação. Por esse motivo, também pedi para os especialistas me ensinarem alguns exercícios que eu pudesse fazer como lição de casa. No quarto, eu repito parte do programa, seja à noite ou mesmo de madrugada. Coitada da minha mãe. De vez em quando, ela acorda para ver se estou dormindo, mas me flagra na exaustiva disciplina.

Apesar de tanto empenho tanto na clínica quanto em casa, o grande desafio até hoje é o joelho esquerdo. Por conta da imobilização, essa parte da perna não suporta a pressão do peso do corpo quando realizo os passos. Além disso, não consegue estender totalmente como deveria ser. Por esse motivo, ainda não larguei das muletas.

O jeito é intensificar os exercícios de alongamento da perna mais afetada. Como o joelho dói nesses momentos. Trata-se da parte mais chata e sofrida das sessões. Ou seja, a minha pior inimiga do momento. Por enquanto, ela vence a maioria das batalhas. Mas ainda não ganhou essa guerra.

A minha expectativa é concluir a fase de recuperação em 20 sessões de fisioterapia, conforme o ortopedista me liberou. Infelizmente, acho que terei de ultrapassar esse número. Desta forma, sou obrigado a ser mais agressivo e me dedicar ainda mais nos exercícios. Agora é correr contra o tempo.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

O dia que não terminou

Como sempre faço todos os dias, entrei no site do Youtube para assistir alguns vídeos e procurar outros que dá vontade de assistir. Encontrei um clipe um tanto interessante. Ele exemplifica fielmente a atual fase da minha vida. É ruim, mas as imagens me fizeram relembrar dos principais momentos do acidente.

Vale a pena conferir porque todo o seu conteúdo leva todos a uma reflexão. E fica mais contundente ainda mais para uma vítima de desastre que, por pouco, escapou de coisa pior. Mas fez levar à conclusão que aquele 1º de novembro de 2008 realmente foi "O Dia que Não Terminou".

http://br.youtube.com/watch?v=UkEY8IXiU2k

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Num inusitado carro (a outra versão)

Mas que dia quente em plena correria de compras. Afinal, era antevéspera de Natal. Pena que estava impossibilitado de conviver com esse clima devido a um acidente de trânsito sofrido no mês anterior. Não tinha como andar livremente porque só conseguia me locomover de muletas com muita dificuldade. Depois de sair da fisioterapia, veio a oportunidade de comandar novamente o volante de um carro.

Era uma BMW, uma Ferrari ou um simples veículo popular? Nada disso. Estava no banco de um carrinho utilizado por deficientes físicos, oferecido pelo supermercado que havia ido junto com o meu pai. De longe, lembrava o ambiente de um automóvel. Em vez dos lugares para os passageiros, o possante tinha apenas o espaço do piloto e uma cestinha para carregar as mercadorias escolhidas.


As ruas com prédios, estabelecimentos e residências deram lugar aos corredores recheados de prateleiras. De semelhante, só havia a chave para ligar o carro. Assim, dei partida nele e fui para o meu primeiro passeio desde o desastre. Andava pelo supermercado que nem uma criança feliz da vida atrás de brincadeiras. O acelerador ficava num botão que apertava com o dedo indicador direito. A marcha ré era feita com o mesmo dedo esquerdo. Só havia um grande problema. Onde estva o freio?

Senti tanta a falta de um mecanismo para parar o carro num momento de emergência. Afinal, a tamanha quantidade de clientes mais parecia o trânsito congestionado das grandes vias paulistanas. Como não conseguia frear o meu meio de locomoção, veio o primeiro acidente após o desastre que me deixou com a perna imobilizada e depois sem parte dos movimentos.

O jeito atrapalhado de conduzir o veículo me fez acertar as pernas de uma típica dona de casa, com lista na mão, carrinho de supermercado cheio de compras e com um monte de filhos. Três no total. Quando fiz isso, a vítima estava de costas. O jeito foi disparar automaticamente:

- Filha, você não tem cuidado com as compras e com sua mãe?

Imediatamente ela percebeu que eu era o responsável pelo descuido quando se virou. A fisionomia dela mudou completamente. De brava, passou para uma cara de surpresa. Em seguida, falou novamente num tom sem graça:

- Desculpe. Pensei que fosse uma de minhas filhas, mas não um deficiente.

O jeito foi responder com bastante agilidade:

- Tudo bem. Mas graças a Deus a deficiência é temporária.

Logo depois, voltei para o conturbado movimento do fim-de-ano. Aos poucos, aprendi a controlar a velocidade do meu temporário meio de locomoção. Consegui evitar novas colisões. Porém, os fatos inusitados continuavam a surgir. Enquanto estava estacionado ao lado dos panetones, um menino de aproximadamente quatro anos se aproximou:

- Por que o tio gosta de andar de carrinho que nem a gente?

Não tive como ignorar a criança, após dar risadas por conta da sinceridade infantil:

- É, o tio quer brincar bastante hoje aqui. Você faz isso na sua casa?

- Eu tenho uma moto que brinco no quintal com o Davi, disse o garotinho, que talvez tenha se referido a um amigo, seu irmão ou um primo.

Com o panetone escolhido, voltei a percorrer os corredores. Novamente ao lado do meu pai, o rumo agora era um dos inúmeros caixas de pagamento. Ao contrário de ir ao destinado para os deficientes, resolvemos enfrentar a fila convencional para os clientes com até 20 itens. Desta vez, o problema foi manobrar o carro para poder passar.

Se fosse num trânsito convencional, seria chamado de barbeiro, pois havia batido diversas vezes nas prateleiras das promoções. Como estava na condição de deficiente temporário, um rapaz tomou uma iniciativa:

- Espera que eu te ajudo a passar.

A atitude solidária deste jovem levou outros homens a me auxiliar. Eles levantaram o carro numa posição que conseguiria passar. Assim, agradeci e paguei as minhas compras.

O fato ter passado por dificuldades ou mesmo algumas situações inusitadas ajudaram a dar um tom mais alegre para o meu primeiro passeio pós-acidente. Na verdade, pensei que seria menos divertido. O clima descontraído também me deu forças para enfrentar novas investidas nos corredores do supermercado, após devolver o principal companheiro dessa aventura e receber de volta o par de muletas responsável pela minha locomoção.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

O primeiro passeio

Tudo levava a crer que era um simples passeio num shopping center. Afinal, quem resiste a uma passagem no centro de compras mais próximos com intuito de ir à praça de alimentação ou ver as vitrines (no caso do público feminino), ou ainda apreciar as mulheres bonitas que passam pelos corredores? Esse cenário seria comum no dia-a-dia de qualquer pessoa. Mas desta vez eu sou o personagem desta história, mesmo com as condições limitadas. Afinal, trata-se da minha primeira saída sozinho, após o fatídico acidente de carro.

O feito histórico aconteceu nesta terça-feira (13-01). Pedi para o meu pai me deixar no Suzano Shopping Center depois de mais uma sessão de fisioterapia. A iniciativa tinha o objetivo de saber como me comportaria no meio do público sem a ajuda de algum parente ou amigo.

Alem disso, esse local me oferecia todas as condições necessárias para a empreitada: o piso é plano e sem depressões, o ambiente fechado me protegia do sol forte do verão ou da chuva, o ar-condicionado mantém o lugar com uma temperatura agradável e há seguranças em todos os corredores em caso de alguma emergência.

Com um par de muletas embaixo dos braços, percorri os corredores com uma certa dificuldade. Os passos pequenos e lentos foram suficientes para me levarem à agência bancária existente no shopping para pagar a conta do celular. Consegui usar o caixa eletrônico. No meu íntimo, comemorei o feito.

Outra finalidade também foi treinar os passos ensinados pela fisioterapia. Aos poucos, quero andar na rua como fazia antes e, ao mesmo tempo, acelerar a recuperação. Também consegui atingir essa meta. Fiquei por uma hora no centro de compras. Porém, algumas caminhadas eram revezadas com alguns momentos de descanso nos bancos.

Aproveitei ainda um desses momentos de recarregar as baterias para ir ao quiosque que vende água de côco. Parei e comprei uma garrafa com o refrescante líquido, colhido na hora pela proprietária. Bebi e voltei a andar.

Resolvi comemorar a primeira saída solitária de casa na última parada. Fui à praça de alimentação e escolhi uma loja especializada em comida japonesa. Comprei um suculento temaki de salmão, afinal há dois meses eu não comia algo da culinária dos meus ancestrais, que tanto gosto. Só não bebi algo alcoólico porque ainda estou a base de medicamentos.

Depois disso, o meu pai voltou para me buscar. Fui embora feliz porque consegui me virar sem buscar ajuda para fazer coisas básicas da vida, apesar dos passos limitados. Agora espero que isso agilize a minha recuperação.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Os danos materiais

O acidente de novembro trouxe danos para o meu corpo. Como já disse antes, a recuperação é bem lenta. O jeito é me adaptar à nova realidade até retomar a minha rotina habitual. Enquanto isso, ainda conto histórias. Desta vez, o jeito é falar sobre os prejuízos materiais.

O meu carro não sobreviveu, como disse um colega de redação ao avisar os demais sobre o desastre. A perda material fica pouco importante quando se sobrevive a uma situação igual a essa.

Desta forma, eu mostrarei como o veículo ficou depois do acidente. Veja só como ficou a frente dele. As fotos são de Jonathan Fujita, mais conhecido como irmão do Eric:

Agora, os danos num ângulo mais próximo. Olha só o estrago. É possível imaginar o impacto do acidente:

O pára-brisa do carro também registrou suas marcas. Foi onde bati a minha cabeça no impacto:
O único lamento dias após o acidente foi o fato de ter tirado o carro da funilaria dois dias antes do acidente. O veículo estava arrumadinho e havia desembolsado uma boa quantia para consertá-lo. Desta forma, termina a história do antigo Escort do Eric, que tinha passagens importantes dentro da vida do seu dono. Mas o melhor de tudo é estar vivo.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Num inusitado carro

Tenho apenas os movimentos parciais da minha perna esquerda. Com a imobilização por 20 dias, a mesma ficou um tanto atrofiada. Por isso, faço fisioterapia diariamente para recuperá-la totalmente. Mas nem mesmo essa limitação me impediu de dirigir novamente após ter sofrido um acidente de trânsito grave.

Essa primeira vez ocorreu na antevéspera do último Natal (23-12). Havia saído da minha primeira sessão de fisioterapia. Fiz tudo isso sempre na companhia do meu pai.

Mas quem achou que havia assumido o volante de um veículo normal, se enganou redondamente. Na verdade, o carro que dirigi era na verdade um daqueles motorizados, usados pelos deficientes nos corredores dos supermercados. O cenário desta curiosa cena foi o D'Avó Hiper do Suzano Shopping Center. Eu me sentia o verdadeiro piloto.

Por conta das minhas limitações, precisei dele para acompanhar nas compras do meu pai. Por incrível que pareça, a sensação era de euforia porque havia saído de casa pela primeira vez para fazer algo de útil. Percorri todos os corredores do supermercado. Comprei alguns mantimentos para consumo próprio e também de olho na ceia de Natal.

Por outro lado, a experiência serviu para outras conclusões. Como os deficientes devem sentir sérias dificuldades para fazer suas compras, principalmente de quem usa cadeiras de rodas. Muitos produtos ficam em locais muito altos das prateleiras. No meu caso, eu ainda consegui levantar. E a pessoa que não pode fazer isso?

Nessa situação, o portador de necessidades especiais precisa escolher uma das duas alternativas possíveis: pedir ajuda a outra pessoa para pegar o produto ou simplesmente desistir da compra. Fica um alerta para os supermercados interessados em contornar essa barreira.

Outro fato foi a falta de respeito dos demais frequentadores. Vários deles fingem ignorar a minha presença por estar na condição de cadeirante. Simplesmente não respeitam as limitações dos consumidores nessa situação e me ignoraram. Ajudar no acesso e na minha circulação que é bem mais precária? Nem pensar. Poucos auxiliaram. Meus parabéns para esse pequeno público.

Pode parecer um tanto de demagogia, mas o meu período de recuperação não é apenas uma fase de sofrimento. Mas também serviu para ter outras experiências e aprender mais sobre o dia-a-dia de outras pessoas. Eu imaginava como devia ser a rotina de um deficiente. Porém, eu nunca havia me colocado no lugar deles, mesmo temporariamente.

De fato, agora eu sei de alguns dos principais problemas de acesso desse pessoal. Além disso, eu aprendi a ter a dignidade igual de um deficiente, apesar das dificuldades diárias. A gente não pode se esconder da sociedade. Pelo contrário. Enfrentar parte desses transtornos só me mostrou que devemos encarar de frente toda a rotina.

domingo, 11 de janeiro de 2009

Fotos no hospital

Foram momentos difíceis logo após o acidente. Principalmente porque fiquei 20 dias internado num hospital e com a perna esquerda totalmente imobilizada. Não podia nem sair da cama para fazer coisas corriqueiras, como ir ao banheiro, me alimentar e dar uma volta na rua.

Nunca dei tanta importância para ações antes normais para um ser humano. Porém, eu, os familiares e as pessoas que me visitavam tentavam deixar mais leve aquele ambiente sombrio e de sofrimento.

Da minha parte, eu não tinha paciência para ler um livro ou um jornal. Além de assistir televisão o dia inteiro (ainda bem que o quarto do hospital tinha TV por assinatura), tentei tirar algumas fotografias com o meu celular. Era o que poderia fazer.

Desta forma, fiz algumas imagens. Essa foi o primeiro teste:

Não era o resultado que esperava, mas até que a foto ficou com um certo estilo. Depois de muitos treinos, eu consegui fazer uma bem melhor:

Mas outras pessoas encarnaram a profissão de repórter durante a internação. O jeito foi fazer pose para quem pedia:

As brincadeiras com fotos se tornaram a principal forma para esquecer o sofrimento depois do acidente. Na verdade, serviram apenas para amenizar porque isso é difícil para deixar de recordar de uma hora para outra.

É difícil lembrar

Tempos difíceis no hospital após o acidente de carro. Foram 20 dias de internação e a perna imobilizada numa única posição. Como era difícil ficar daquela forma. É terrível lembrar disso. Mas já passou.

Para quem não sabe, a fratura na região da bacia obrigou os médicos a colocar a minha perna esquerda num sistema chamado "tração". O esquema consiste em deixá-la sustentada num determinado peso para a mesma não ficar mais curta que a perna direita durante o período de cura.

Bom, assim fica mais fácil ver como é esse sistema:



Só a publiquei para todos compartilharem só um pouquinho com o meu drama. Como já disse antes, não desejo isso nem para o meu pior inimigo.


sábado, 10 de janeiro de 2009

Com ou sem apoio

Essa fase após o acidente foi muito difícil. Tomara que ninguém passe pela mesma situação porque simplesmente atrasa a vida. A minha rotina agora é resumida somente à fase de recuperação, reabilitação e superação. Tudo isso para retomar os mais simples movimentos da perna. No meu caso, a esquerda.

Por outro lado, eu posso tirar as boas lições de todo esse fato. As minhas dificuldades me levaram a repensar o que quero para os próximos anos. E, ainda, me mostrou as pessoas que se preocupam comigo, inclusive de quem eu menos esperava. Quanto à família, sem comentários.

Os parentes mais próximos, evidentemente, estenderam as mãos e se desdobram até agora para dar o suporte necessário. Afinal, eu ainda dependo muito da ajuda de terceiros desde colocar comida no meu prato e para me levar à clínica de fisioterapia. Essa última função é revezada pelo meu pai e pelo meu irmão.

Mas algo me surpreendeu muito. Muitos colegas de redação - inclusive os chefes diretos - telefonaram imediatamente ao saber do acidente. Nos primeiros dias, o meu celular não parava de tocar com o objetivo de saber notícias. Alguns, como o Willian, a Karina e o Silvio, chegaram a me visitar no hospital. Depois da alta, muitos deles ainda me telefonam.

Nunca esperava atitudes deste tipo por um único motivo: sou muito fechado e pouco converso no ambiente de trabalho. E, em muitas ocasiões, reclamava do sistema.  Essa iniciativa me levou à conclusão de que devo repensar minha forma de agir no serviço e sobre alguns colegas.

Paralelamente às considerações, houve uma única pessoa que me decepcionou. Bom, quem lê esse texto já deve imaginar a resposta. Na minha opinião, eu não contei com o tão esperado apoio na época mais difícil da minha vida. Em certas ocasiões, agi de forma grosseira. Eu confesso. Talvez, fiz isso inconscientemente para ver se o amor superasse os problemas.

Pode parecer um tanto egoista ou mesmo amargura, mas não houve essa superação na minha modesta avaliação. Não teve o menor esforço e a tentativa de driblar os percalços. É muito fácil culpar a distância como motivo da ausência.

Para mim, isso não justifica porque costumo agir de outra maneira. Neste caso, só serviu para mostrar que um bom relacionamento só dura quando existem apenas os bons momentos. São fatos da vida. Mesmo com as cabeçadas, servem para nos ensinar.

Decepcionado ou surpreso, o jeito agora é continuar no caminho da recuperação. Preciso passar por essa fase para depois colocar em prática as conclusões tiradas em meio ao inesperado período sabático.  Seja com o apoio inesperado ou sem a presença antes aguardada. 

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Quanto susto!

De volta a esse blog depois ficar três meses completamente sem atualização. Confesso que, em parte, foi um relapso. No entanto, uma reviravolta mudou completamente a minha vida. Por esse motivo, começo este ano novo com essa história. Não desejo isso nem para o meu pior inimigo.

Nunca imaginei que um acidente de carro poderia parar totalmente a minha rotina. Foi na madrugada do dia primeiro de novembro de 2008. Eu voltava para casa, em São Bernardo do Campo, quando um automóvel vermelho me deu uma fechada. Infelizmente, não deu tempo de ver qual era o modelo dele (talvez seja um Palio) e nem para anotar o prefixo das placas.

Uma simples manobra ousada foi suficiente para acabar com o meu veículo, que havia retirado do mecânico dois dias antes. Esse problema ainda foi pequeno. Além de perder o carro, passei os meus 20 piores dias da minha existência internado no hospital.

Não podia sair da cama porque minha perna esquerda ficou imobilizada por um peso de até oito quilos. Nos últimos dias, tinha apenas dois quilos. Afinal, foram um deslocamento de fêmur e uma fratura no acetábulo, como os médicos chamam essa região do corpo. Para os leigos, esta última parte é conhecida como bacia.

Tudo era feito na cama. Banho superficial com ajuda das enfermeiras, com direito a vencer a vergonha e ficar pelado na presença delas. Além disso, fazia todas as outras necessidades sem sair dela com ajuda de um "papagaio", no caso de coletar a urina, e uma "comadre" (fezes). Que dureza.

Agora, estou na fase de recuperação. Depois de receber alta, fiquei mais 19 dias numa cama na casa dos meus pais. Atualmente, consigo andar com ajuda de muletas e faço diariamente as sessões de fisioterapia.

Quanto à minha rotina, ela está totalmente alterada. Parei de treinar natação e musculação até segunda ordem. Também me encontro afastado do trabalho na redação do Diário de São Paulo. Os médicos alegam que a recuperação vai durar pelo menos três meses. Só me resta ter forças e fé para voltar logo ao que era antes...