Depois de ficar parado por muito tempo, estou de volta à academia. Ainda não é no mesmo ritmo de treinamento se comparado a antes do acidente de trânsito, mas retomei as práticas esportivas por orientação médica com muita alegria. Afinal a natação e a musculação já eram as minhas principais terapias nos últimos anos como forma de aliviar o estresse. Apesar da felicidade em torno desse retorno, me deparei com um fato inusitado. Um menino de apenas cinco anos conseguiu desviar minha atenção, até então voltada para agilizar a reabilitação física nos treinos.
Isso mesmo. O pequeno Nicolas roubou a cena literalmente na manhã de uma sexta-feira, quando havia saído em direção ao vestiário para tomar banho e ir embora. Eu já conhecia essa criança porque frequentamos as aulas de natação no mesmo horário. Na piscina, costuma ser bem esperto e com aquela agitação peculiar de um garoto da sua idade. Vez ou outra, faz brincadeiras comigo, com a instrutora e com os demais alunos adultos.
Após as tradicionais braçadas na água, havia ido direto para o chuveiro. Durante aquela deliciosa ducha quente que relaxa todo o corpo, ouvi alguém batendo no box onde estava. Naquele momento, foi uma surpresa, pois pensei quem poderia ser. Nenhum adulto costuma fazer isso. Ao abrir a porta, me deparei com o pequeno Nicolas parado na minha frente. Assim, a criança fez um curioso pedido:
- Tio, você pode ligar o chuveiro para eu tomar banho?
Então, o jeito foi interromper o meu banho. Desta forma, me enxuguei rapidamente e me enrolei na toalha para ir em direção ao box escolhido pelo menino. A solicitação de socorro tinha justificativa. Nicolas não sabia como usar o chuveiro movido a gás, que conta com dois registros para liberar a água. Um deles controla a temperatura quente e o outro libera o líquido mais frio.
A existência de dois registros confundiu a criança, que tentou se explicar:
- Eu abri um deles, mas a água só sai fria.
Não há como recusar um pedido de uma criança. Ainda mais devido à forma educada que o pedido foi feito pelo menino. Desta forma, acertei a temperatura da água. Antes dele entrar, resolvi verificar se a situação estava sob controle:
- Agora, a água está boa para você tomar banho?
Imediatamente, o pequeno Nicolas respondeu a pergunta positivamente, com uma fisionomia de satisfação e felicidade. Não faltou a palavra obrigado por parte dele no final. Minutos depois, eu terminei o banho e fui me trocar. O menino continuava no chuveiro, quando uma voz feminina do lado de fora do vestiário perguntou:
- Nicolas, o que você faz aí?
Imediatamente, ele respondeu:
- Tomando banho, mãe.
Em seguida, a mesma voz feminina perguntou se ele tinha sabonete e xampu (é assim mesmo que se escreve em português). O garoto disse que não. Então, veio uma ideia mirabolante. Fui em direção ao chuveiro onde ele estava:
- Abre a sua mão para colocar um pouco disso.
Para ele continuar com aquela alegria, decidi dar um pouco do meu sabonete líquido e do xampu. Assim, ele conseguiu tomar o banho completo. No entanto, a mãe continuava a questioná-lo na porta do vestiário:
- Como você vai tomar banho se você não levou nada aí?
Com a minha ação, o pequeno Nicolas passou a falar que havia usado xampu e sabonete. No entanto, a mãe não acreditava nas palavras do filho:
- Não mente para mim, filho. Isso é muito feio.
A mãe continuou a chamá-lo do lado de fora. Mas o menino sequer se preocupava com os apelos dela. Ele se enxugava, arrumava sua mochila e até participava da conversa dos homens adultos dentro do vestiário masculino. Parecia um verdadeiro homenzinho na roda. Muito engraçado.
Ao sair do vestiário, eu avistei a Tatiana, a instrutora de natação da academia. Antes de ir embora, dei um alerta a ela:
- Avisa para a mãe do Nicolas que ele realmente tomou banho. Eu dei um pouco de xampu e sabonete líquido. Se ela não souber disso, pensará que o filho é mentiroso.
A reação da instrutora foi de tamanha surpresa. A mesma não conseguiu segurar os risos e agradeceu a minha iniciativa. Ainda nessa conversa, descobri que o pequeno Nicolas havia driblado a sua mãe. Ao chegar à academia, o garoto foi rapidamente para o vestiário masculino sem ela perceber. Deixou a mochila no armário e se dirigiu para a aula.
Nicolas agiu desta forma porque não queria ir mais se trocar no vestiário feminino sob os cuidados da mãe e junto com a irmã mais velha, que também pratica natação no mesmo horário. Dias depois, tive uma interessante conversa com o garoto sobre o assunto. Os motivos apresentados tinham sentido:
- Tio, não gosto de ir ao vestiário feminino porque as mulheres falam muito e fazem barulho demais. Algumas dão até bronca em mim porque brinco lá dentro.
Para completar sua explicação, Nicolas começou a imitar as mulheres que se referiam. Os adultos no vestiário masculino deram muita risada com o menino. Um dos rapazes concordou imediatamente com os argumentos apresentados:
- Tão pequeno e já sabe das coisas, exaltou o rapaz.
Mesmo engraçada, essa situação também teve um desfecho feliz. Além dos agradecimentos da mãe dele mais tarde, o pequeno Nicolas sempre vem conversar comigo durante a aula ou fora dela. Ou seja ganhei mais uma amizade, desta vez de um pequeno homenzinho. Às vezes, uma empatia igual a essa vale muito mais em relação a de um adulto. Afinal, as crianças sempre são sinceras. Quando gosta de uma pessoa, pode ter certeza que é algo verdadeiro.
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