terça-feira, 2 de março de 2010

Uma emocionada despedida

Mudanças num determinado veículo de comunicação sempre trazem aquela tradicional movimentação de profissionais. E, obviamente, isso acontece hoje no Diário de São Paulo, onde um novo proprietário assumiu desde dezembro passado. Alguns chegam para melhorar a qualidade do conteúdo. Outros vão embora ou por não terem se adaptado às modificações ou porque encontraram novas oportunidades. Afinal, sempre será desta forma.

E isso aconteceu mais recentemente com três profissionais da casa: Isabela Barros, Aiuri Rebello e Plínio Delphino. Os três partiram para novos horizontes, numa agência de notícias, numa viagem à Europa e no SBT, respectivamente. Esse é o caminho natural da nossa profissão.

Sem querer desmerecer os demais, um deles com certeza representa parte da história mais recente do matutino, desde os tempos do velho Diário Popular. Ele se chama Plínio Delphino. Esse excelente repórter policial passou treze anos de sua vida na redação, desde os tempos de um simples estagiário.

Foi justamente nessa época que o conheci, em 1996, quando o mesmo me telefonava para ajudá-lo na apuração das constantes rebeliões na Cadeia Pública de Mogi das Cruzes. Naquele tempo, também dava meus primeiros passos na minha região, na Rádio Metropolitana.

Como a internet e o celular ainda eram artigos de luxo, o jeito era se virar por meio de contatos telefônicos. O Plinião, como também é conhecido, me ligava no orelhão próximo à cadeia e vice-versa. No último caso, fazia isso até por meio do então recente cartão telefônico.

O tempo passou e onze anos mais tarde o encontrei na própria redação do Diário de São Paulo. Por três anos, convivi com esse grande e respeitado profissional. Sinto-me honrado em colaborar, mesmo que timidamente, com a sua trajetória quando ainda cobria um pouco os fatos policiais.

Mas o que me chamou a atenção na sua despedida foi a carta deixada aos demais companheiros da redação, via e-mail. É muito difícil não se emocionar (eu me emocionei a ponto da voz ficar embargada). Quem se diz jornalista com certeza deve ter se solidarizado com o conteúdo. Já a pessoa que ainda não leu, vale a pena desfrutar desse emaranhado de palavras de gratidão.

Por esse motivo, decidi publicar na íntegra a carta deixada pelo Plinião como a minha simples homenagem a quem se dedicou de coração e já tem um capítulo na história desse centenário matutino. Coloquei isso com autorização do seu autor, claro.

Aiuri e Isabela, da próxima vez prometo voltar com uma postagem mais equilibrada com esse trio que deixou o jornal. Com todo o perdão, mas não tinha como deixar essa carta do Plinião passar em branco:

"Outubro de 96. Lá estava eu, diante do prédio do DIÁRIO POPULAR, como uma criança olhando para o pai, de baixo pra cima. Olhar de quem está curioso, de quem precisa de espelho para aprender e seguir a vida adulta. Na portaria me mandaram para as alturas. O quinto andar. A famosa redação do Dipo. E pra chegar lá, sempre havia um ascensorista cheio de história ou de manias no nosso caminho. Seo Paulo barrava até diretor se o elevador estivesse cheio. O São-Paulino, que colava o rosto na parede, lustrava o painel do aparelho a cada segundo e nunca terminava um assunto, porque o andar chegava antes do epílogo. O Daniel da madrugada, trabalhava com um guarda-chuva gigante à mão. Personagens únicos de um lugar ímpar.

Motoristas crentes, malucos, parceiros, corretos, nem tanto, pulsavam nas ruas com a gente até na contramão. Fotógrafos queriam engolir o mundo em imagens. E a gente enchendo a página de histórias pra lá de saborosas, inéditas, sensacionais. Telefones latejantes irritavam a redação o dia inteiro. Era nervoso, contagiante. Cresci aqui, nessa aura romântica, sem internet ou celular, em tempo que o bloquinho era prova irrefutável de que teu trabalho foi árduo. A gráfica ficava no prédio da redação. À noite, a gente saía e o jornal já estava sendo encartado na rua movimentada. Uma fila de Kombi aguardava para levar ao leitor a edição, em preto e branco, que sujava a roupa, as mãos, mas valia cada centavo do leitor.

O DIPO envelheceu e então chegou o DIÁRIO DE S.PAULO. Novos chefes, novos rumos, grandes novos amigos. Amadureci. Mudei. E vivi a minha melhor fase profissional com a mudança. O que eu aprendi com os antigos era forte, era a grande base. Mas, os meninos novos me trouxeram o olhar moderno, irreversível da realidade virtual. Não importa a forma e a época. Percebi que essa "casa" sempre funcionou como uma grande família. Aqui, quase sempre, as reprimendas vêm do coração, para que o erro sirva de lição. Aqui, os colegas sempre vibraram pelo teu sucesso e o ego nunca foi tão grande quanto o trabalho bem feito. É o que eu vi. Ou pelo menos o que eu precisava ver. Queria poder voltar muitos anos e abraçar um por um e agradecer por fazer parte da minha vida - afinal de contas, passei 1/3 dela dentro dessa grande engrenagem.

Agora, 13 anos depois, o Plínio do DIÁRIO, adolescente, quer se rebelar um pouco. Vou fugir de casa. Mas, deixei meus pais avisados. O DIÁRIO foi o "chão que me consagrou". "Foi meu herói e meu bandido". E é por isso que deixo esse lugar cheio de saudade. Mas, com a alegria de ver pessoas de caráter, de fibra, generosas, amigos gigantes, parceiros de verdade, honrando toda essa história. Me sinto orgulhoso de ter feito parte de tantos times maravilhosos que se formaram aqui. Preciso ir, mas, não me peçam para fechar a porta! Valeu demais...

26/02/2010
Plínio Delphino"

Um comentário:

Zé! disse...

Lindas palavras realemnte e o que faz sempre o grande homem é a gratidão! E nesse caso tanto seu amigo quanto você Fujita são gratos. Parabéns pelo post e o significado dele pois dá a nós leitores o ar da humanidade e da esperança que educação, princípios, agradecimento e amizade verdadeira nunca poderão deixar de existir entre aqueles que sentem e amam. Parabéns!